ARTIGO DE MANOEL CARIOCA FALANDO SOBRE INFIDELIDADE PARTIDÁRIA
Manoel Carioca Martins de
Araújo (bacharel em direito e auditor fiscal do estado)
INFIDELIDADE PARTIDÁRIA x
INFIDELIDADE SUPERPARTIDÁRIA OU COLIGÁRIA.
A constatação de que, somente no
Rio Grande do Norte, a Procuradoria Regional Eleitoral ingressou com 57 ações
pedindo a perda do cargo eletivo por infidelidade partidária, bem como a mais
recente decisão do Supremo Tribunal Federal - STF no sentido de que “o mandato
político pertence à coligação e não ao partido”, despertou a minha curiosidade e
me levou a fazer algumas reflexões acerca do assunto. Inicialmente vou me
reportar ao instituto da infidelidade partidária. A perda do cargo, por
infidelidade partidária, está prevista na Resolução 22.610/2007 do TSE que, em
seu artigo 1º, assim disciplina: “Art.
1º - O partido político interessado pode pedir, perante a Justiça Eleitoral, a
decretação da perda de cargo eletivo em decorrência de desfiliação partidária
sem justa causa.” Concordo
plenamente com a perda do cargo do parlamentar infiel.
Ora, não se pode admitir
que um candidato use a legenda e a estrutura do partido ao qual é filiado e,
depois de eleito, migre para um outro partido, que foi seu adversário. Qualquer
filiado tem liberdade para, a qualquer momento, sair ou se filiar a determinado
partido, sem que, com isso, sofra qualquer sanção.
Entretanto, se o filiado
exerce mandato, ao se desligar, ele deixa o cargo para o partido que o ajudou a
conquistá-lo, e este, o partido, indicará o suplente que assumirá o mandato.
O TSE
já decidiu reiteradas vezes nesse sentido: o cargo é do partido e não do candidato.
A legislação eleitoral também prevê a possibilidade dos partidos participarem
do processo eleitoral através de coligações. Daí surgiram dúvidas sobre a quem pertenceria
o mandato no caso de vacância. Conforme dito no início, o Supremo Tribunal
Federal -STF, em abril/2011, decidiu por 10 a 1, portanto com o quorum
completo, que, no caso de vacância, o mandato político pertence à coligação e
não ao partido. Isso significa que o mandato somente pertence ao partido se ele
participou sozinho do processo eleitoral, ou seja, não integrou nenhuma
coligação.
A Ministra Carmem Lúcia, relatora do caso, reconhecendo que os
partidos têm autonomia para se coligarem, assim argumentou em seu voto: “A
coligação passa a funcionar como um superpartido do ponto de vista formal, ou
seja, jurídico; e substancial, com formação de idéias”. E completou dizendo:
“As coligações são autônomas e adquirem capacidade jurídica para representar o
todo, incluindo processos judiciais”. Por sua vez, também justificando o seu
voto, o Ministro Fux argumentou: “A coligação passa a substituir os partidos,
inclusive juridicamente. O mandato não é pessoal, é do partido. E o partido pode
ceder o mandato para a coligação. O quociente eleitoral passa ser da
coligação”.
No meu modesto pensar são consistentes as argumentações dos
referidos Ministros e mais do que acertada a decisão do STF. Se o mandato foi
conquistado pelo esforço desse “superpartido”, ou seja, da “coligação”, é claro
que esse mandato pertence à coligação e não ao partido do qual o candidato é
filiado, até porque os demais partidos que compuseram a coligação também envidaram
esforços para a conquista dos mandatos. E nesse momento, diante da grande
quantidade de processos de perda de mandato eletivo por infidelidade
partidária, faço as seguintes perguntas:
1ª) Considerando que o mandato de
vereador pertence à coligação quando é que fica caracterizada a infidelidade?
2ª)
Em qual situação a coligação pode postular, em juízo, o cargo que lhe pertence?
Atrevo-me a respondê-las: Ocorre a
infidelidade quando o detentor do mandato se filiar a um partido que não
integrou a coligação pela qual foi eleito. Justifico: Coerente com a decisão do
STF, a minha certeza é no sentido de que não se pode falar em Infidelidade
quando houver mudança de partido dentro da mesma coligação. Exemplificando, se
o detentor do mandato sair do partido “A” e se filiar ao Partido “B” (integrante
da mesma coligação), ele está sendo infiel a algum partido? A resposta só pode
ser negativa, pois o cargo não é de nenhum partido e sim da coligação, do
superpartido. Não se deve esquecer que o mandato foi conquistado com o “quociente
da coligação” e não com o “quociente partidário”. Assim, ele só será
considerado infiel se sair da coligação, isto é, não ficar filiado a nenhum dos
partidos coligados. Neste caso, ou seja, se ele sair da coligação, aí sim, estará
caracterizada o que eu denomino “Infidelidade superpartidária”, ou então de “infidelidade
coligária”.
Quanto à segunda pergunta, respondo dizendo que a coligação pode e
deve postular o mandato que lhe pertence, no exato momento em que ficar comprovada
a infidelidade superpartidária do candidato eleito.
Não se discute mais que, do
ponto de vista jurídico, a coligação tem capacidade postulatória e legitimidade
para pedir a decretação da perda do cargo eletivo do considerado infiel, na
forma do art. 1º da Resolução 22.610/2007, do TSE.
Finalizo dizendo que não tenho
como admitir que um partido seja impedido de receber o mandato de um novo
filiado, se esse mesmo partido, participando de uma coligação, contribuiu,
talvez até de forma decisiva, através do quociente superpartidário, para a
conquista daquele mandato.
É com esse entendimento que defendo a necessidade de
uma alteração na Legislação Eleitoral (artigo 1º da Resolução 22.610/2007 do
TSE), de modo a incluir a coligação como legitimada para pedir, perante a Justiça
Eleitoral, a decretação da perda de cargo eletivo em decorrência de desfiliação
superpartidária sem justa causa, e também acrescentar o inciso “V” ao parágrafo
1º do art. 1º, considerando como justa causa a “filiação a partido da mesma
coligação”. Sendo um leigo em Direito Eleitoral, o meu objetivo, com o
entendimento exposto, é motivar uma discussão em torno do assunto e, dessa
forma, contribuir para a diminuição da insegurança jurídica e, quem sabe,
evitar o abarrotamento dos tribunais com ações descabidas.
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